Recordações que não esquecem




A propósito do aniversário da Barragem do Castelo do Bode, aqui fica um exemplo de quadras populares demonstrativas do sofrimento causado pelo enchimento em 1950.


Excerto de "Recordações que não de esquecem"
Manuel António Coelho (195? - Vila de Rei)
Poema retirado do livro:
Lendas, contos e poesia de Ferreira do Zêzere – Sá Flores

De Constância ao cimo do Zêzere
Digo eu com ligeireza
Em parte nenhuma há alegria
E em todo o lado há tristeza.

Da Foz do Codes a água das casas
Causa dó e paixão
Já não se vê o Conqueiro
Nem o lugar do Coucão.

Dois lugares tão mimosos
Cá da nossa freguesia
Ficou tido debaixo de água
Tanta coisa que lá havia.

Eu, ao dizer estas coisas
Derramo lágrimas aos caixões
Só em pensar na Amiosa
E na varja dos feijões.

Adeus lugar da Matagoza
E também Matagozinha;
Adeus ribeira da Aveleira
E ribeira da Cabecinha.

Adeus ó água das casas
Há muito ano te conheço
Até cobriram as terras
E deixaram o cimo do cabeço.

Do Coução voltei para baixo
Ia-se mesmo o Sol a pôr
E vi cobertas as melhores terras
Que pertenciam ao vale do sôr.

Ó ribeiro do Conqueiro
Também deixaste nomeada
Castigaste a valentona
Arrancoeira e Mealhada.

Tu foste um ingrato
Não és digno de carinhos
Cobriste terras de pão
E ainda três moinhos.

Adeus ribeira de Codes
Adeus belos salgueirais
O canto dos rouxinóis
Não tornamos ouvir mais.

Adeus ribeira de Cains
Eu de ti conheço pouco ou nada
Mas sei que castigaste
O Cardal e a Bairrada.

Da Foz de Codes para cima
Contando já a Aderneira
Ficou tudo debaixo de água
Hortas e Castanheira.

….

Devido à tua fundura
A tua água é azul
Pensa bem o que fizeste
Pelo norte e pelo sul.